Viver a cidade

Uma oportunidade profissional me fez mudar de cidade, prioridades e visão de vida.

Tadeu Saldanha
4 min readJan 13, 2021

Durante a maior parte da vida, eu morei em Olaria, Rio de Janeiro. Assim como outros milhões, era um suburbano. E isso geralmente significa morar a uma hora ou mais das suas atividades, pegar transporte público lotado e ineficiente, com caminhos muitas vezes inseguros. E isso foi uma verdade durante boa parte da minha vida no Rio, na época da escola, da faculdade, do trabalho.

Muitas vezes eu ficava até mais tarde na região onde eu trabalhava, para aproveitar algo e fugir do trânsito. Sentia preguiça de voltar para casa. Sexta era o pior dia. Final de semana, então? Nem se fale. Eu odiava andar de transporte público, que era ainda mais lento e mais perigoso. Eu mal visitava a zona sul e as praias do Rio por esse motivo. Até gosto de caminhar, sempre fiz tudo a pé pelo meu bairro, às vezes me deslocava entre bairros a pé para ver amigos, não era um problema. Só não gostava mesmo de ficar transitando pelo Rio em ônibus.

Depois de anos nesse jogo, saindo do subúrbio e indo para a Barra onde trabalhava, avaliava a ideia de ter carro. Eu não achava muito interessante financeiramente, e não gostava também do estresse de dirigir. Mas a diferença era brutal; muitas vezes o intervalo de tempo de ir até o ponto de ônibus e esperar ele chegar era metade do caminho já feito de carro.

Então comecei a avaliar a ideia de sair de Olaria e morar mais perto do trabalho. Será que pagar um aluguel por ali é tão pesado, ou terei que pagar para morar longe e pagar para ter um carro, para amenizar esse efeito? Para que estou trabalhando? Tudo que eu posso ser é periférico? Tanto em localização como cidadão?

Sorte e oportunidade

Quando eu estava quase decidido a sair do meu bairro, surgiu uma oportunidade de trabalho em São Paulo, e um amigo tinha dito que poderia dividir o apartamento com ele, a 15 minutos de ônibus do emprego. Eu nem sabia o que fazer com esse tempo, parecia tudo tão leve. Tão rápido. Eu tinha tempo para fazer o que quisesse, muitas vezes eu voltava para a casa a pé, simplesmente para aproveitar não estar com pressa. E ainda morava no centro expandido, com diversas opções de qualquer coisa que quisesse fazer em São Paulo. Passava os finais de semana caminhando pelos bairros do centro, conhecendo cantos, cafés, lojas, prédios, tudo que eu podia ver.

Eu não sabia que a vida poderia ser assim. É um impacto absurdo, ter mais tempo no seu dia, não chegar no final de semana destruído de passar quase 13 horas na rua. Passei a repensar sobre como eu vivia assim, como eu poderia aproveitar melhor o Rio, meu bairro, e na cidade como um fim, não um meio para chegar da casa ao trabalho. Tanta coisa interessante no caminho, cada rua de passagem, cada bairro que a gente não presta atenção, é a casa de alguém, é um lugar vivo e cheio de história.

Passei a querer mais praças e menos avenidas, mais espaços de convivência, ruas mais calmas para a gente ficar na calçada, espaço para as crianças jogarem bola, aprenderem a andar de bicicleta, e não simplesmente uma nova avenida ou corredor de ônibus desconfigurando um bairro. Eu sempre apreciei isso em bairros mais caros ou pontos turísticos. Mas por que a gente não se vê na posição de ter isso também onde a gente mora? Se não é isso, muita gente quer se enfiar em um condominio fechado e viver uma vida à parte da cidade. Muitos de nós reconhecemos outras cidades e outras culturas por terem cidades vivas e seguras, ou a cidade do interior, onde também se faz tudo a pé e se aproveita a rua.

Por que não aqui? Por que não agora?

Nossas escolhas por individualidade é o que está esterilizando nossos bairros e nossas cidades. Se isolar em um condomínio, ir a um shopping fechado, é o que torna a cidade pior, e não melhor. É o que distancia a gente da gente. É o que faz a cidade deixar de ser um lar para ser um caminho para o trabalho.

Essa busca pelo controle e segregação também causa problemas agora com a pandemia, em que todo esse aparato fechado é mais um problema do que uma solução. Uma boa rua, com uma calçada espaçada ao ar livre, mais parques, mais verde, fariam muito melhor às pessoas do que o contrário.

É por essa visão, é por querer um espaço mais humano, que vim também compartilhar meus pensamentos, e tentar construir uma cidade diferente, para todos. Como será que podemos contribuir com sua cidade? O que podemos fazer para aproveitar melhor e com isso construir comunidades melhores?

No meu caso, eu agora tento usar a tecnologia e colaboro com o projeto do Cidade Ciclável e vou usar esse espaço para dialogar sobre minha relação com a cidade, mobilidade e tecnologia.

Espero sua visita nos próximos textos :)

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